Felicidade virou perversão e obrigação nas Redes Sociais.

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Não aguenta? Peça para sair!

 

Ser feliz nas redes sociais parece fácil em tempos midiáticos. Faz a pose com um biquinho, para realçar os lábios carmim, para um selfie com o look do dia, tipo “vestida para matar” e postada no Facebook (as mais velhas) e ou no Instagram (as mais jovens), com a legenda “sempre de bem com a vida”. Missão cumprida: aos olhos do mundo sou uma mulher bonita e guerreira exemplar. Sempre preparada para o dia a dia.

 

O duro é o depois. Temos que enfrentar o cotidiano sem tempo de retocar o batom e necessariamente de salto baixo. A idade não me permite mais usar aqueles sapatos tão adorados por mim e por todas as lindas e inspiradoras drag queens, pois já perco o equilíbrio e já não existe modelo ou marca que sejam confortáveis o bastante para os meus andarilhos pés.

 

Não há deslocamentos simples nas metrópoles. Não existe teletransporter. Vou ter que enfrentar o trânsito irritante, perder a paciência que declaro ter nas redes sociais, vou xingar muito, quer fazendo o meu trajeto no meu carrinho adquirido de terceira ou quarta mão, a duras penas, e já há seis ou sete anos comigo, frise-se, sem seguro (rezo antes de sair de casa), ou no buzão, onde pessoas cheirando mal se esfregam em mim, quer acidentalmente, quer  mal intencionadas exercitando sua libido. Saio cheirosa de casa e antes de chegar ao meu destino, roubam o meu perfume, me sinto suja e usada. Mas tenho que fazer novo post afirmando quão sou feliz nesta chuvosa, mas linda, ainda que alagada, mas perfeita manhã de segunda feira, chegando ao meu maravilhoso trabalho, que aliás me remunera muito mal e o patrão é um asno insuportável.

 

Mas o que assusta mesmo, é que se você não preenche um determinado padrão, de beleza, crenças ou ideologia, você será patrulhado e molestado nas redes sociais. Tem que rezar na mesma cartilha da vogue, usar os mesmos modelitos, frequentar a igreja da moda, preferencialmente a Anglicana, que é a que está com a bola da vez, ter opiniões clichê sobre o papa Francisco, o presidente americano Donald Trump, o pré-candidato à presidência do Brasil, de extrema direita, Bolsonaro, ou ainda ideias sobre o pré -candidato de esquerda que está cumprindo pena judicial.  Temos que pensar em blocos. Todos com com os mesmos gostos e ideias engessadas. Enfim, todos rezando o mesmo mantra ou seremos jogados no limbo das redes sociais, privados dos desejados likes. Mundo moderno!

 

A ideia que se quer vender é que todos somos felizes de forma perene e sem direito a vacilos e oscilações. Magros, belos e felizes. A imagem conta muito mais que a genética e para mantê-la passa-se por cima até mesmo da saúde. Por isso mesmo, todo dia, surgem novas fórmulas, drogas e dietas mágicas para nos gratificar, entorpecer e nos tornar sujeitos felizes. Felizes e alienados dentro da engrenagem midiática.

Atenção às armadilhas: o que se recomenda hoje como saudável, pode ser o vilão de amanhã. Claro que a ciência evolui e as orientações podem mudar, mas fique antenado! Tudo muda muito rápido. Siga o fluxo!

 

Muda a moda, mudam os hábitos, as dietas de sucesso da temporada, os amores de verão e os melhores amigos de infância também. Tudo é fugaz e absolutamente passageiro. Tudo é descartável! Inclusive e principalmente as relações familiares, sociais e trabalhistas.

Os irmãos, cheios de mágoas uns dos outros, postam nas redes, as mesmas fotos que insistem em exibir nas suas salas, em belíssimos porta-retratos, corroborando com a falsa ideia de famílias perfeitas e muito unidas. Os filhos mandam mensagens para facebookiano algum botar defeito, carinhosas e dirigidas para os pais, cheias de expressão de gratidão e genuíno afeto. Na vidinha real, entretanto, são rebeldes, não ouvem conselhos ou orientações, são hostis com os seus velhos. Tudo cena. Fingem um amor incondicional. Quem não os conhece e se quiser que os compre!

 

Os amores são todos passageiros, pois o nível de intolerância às diferenças é absurdamente gigante, não se suporta viver quaisquer frustrações, ser contrariado no desejo e nas opiniões e o imediatismo impede que se espere o melhor momento para gratificações. O bom mesmo é estar apaixonado. Como as paixões tem prazo de validade, não se investe no amor, pois o preço requer exercício de aceitação, paciência e respeito. Melhor trocar o parceiro.

 

Tudo que é diferente de mim é intolerável. Modifica o meu humor. Para pior. Na escola ou no trabalho, a expressão bullying é uma tônica. O mundo é dos fortes. Ou eu sofro assédio moral dos amigos e colegas ou eu me imponho e faço alguém sofrer para poder me defender ou para eu ter visibilidade. Tenho a minha autoconfiança minada pelo meu chefe abusivo e acho natural zoar do tímido colega que usa óculos fundo de garrafa, sequer me dando conta do mal que promovo no outro.

 

Tudo parece uma brincadeira inocente que só é perturbadora se a vítima sou eu. E quando isso acontece nas redes as repercussões, muitas vezes, são incomensuráveis, as vezes sem chances de reparação, com prejuízos assustadores para os que se sentem mais vulneráveis, pois percebem o seu fake mundo desmoronar e os deixa sem saídas para reagir. Alguns jogam a toalha!

 

Por Deborah Pimentel

 

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